quarta-feira, 30 de maio de 2007

Caseira

O Sol esquentou.
Calor desenferrujou
partes molhadas de mim

Meu ombro esquecido
úmido
Lembrou da prima Vera
(aquela que mora no Rio)

Meu punho dolorido
frio
me disse bom dia
espiando o café da manhã

Minhas articulações estalantes
pularam saltitantes
fazendo com que eu levantasse
sonoramente confusa

Fechei as pálpebras cortinas num gesto último
de uma trégua matinal...

Meu corpo me pede raios
Minha cabeça pede pára-raios

segunda-feira, 28 de maio de 2007

Hai Kais ( ou quase Hai Kais) de um olhar baiano

Quer ver maresia
sai de onde esta
e vem pra Bahia


A Bahia é uma festa.
Não falta nego
querendo uma fresta


A Bahia tem mar profundo
mas cá na beira
é bem imundo


A Bahia tem baianas bonitas
de saia rodada
e laços de fita


Meu bem querer é baiano
tem sempre um sujinho
debaixo do pano


No interior da Bahia
tem mato, rio, cachoeira
e aos Domingos tem feira


Vem cá, neguinho, vou te beijar
mas nem inventa
que não quero casar


A praia da Bahia é na segunda
dá pra ver mais mar
e menos bunda


Na Bahia tem
acarajé, vatapá, tapioca
e tem também muita “popoca”!


Tem muita gente dizendo que é bamba
mas como baiano
neguinho não samba


Ô, nega dá uma forçinha
eu tô é de olho
na sua vizinha

A mulher vem na centelha
com a voz de Yansã
toda vermelha


Meu coração faz tum-tum
se vir um caboclo
com a conta de Ogum


Lá da colina tu reza por mim
e traz uma fita
do Senhor do Bonfim


Meu amor, quer viver poesia?
larga os botões
e vâmo pra Bahia

Mais um dia
Pra eu fazer meu ofício
Que é cantar a Bahia

sábado, 26 de maio de 2007

Senhora Formiga (para Paulinho e outras crianças)

Senhora formiga aonde vai toda prosa?

- Passear no canteiro de rosas

Essa formiga é engraçadinha
em fila indiana
parece uma linha

Senhora formiga aonde vai apressada?

-Pegar o açúcar de dentro da lata

Essa formiga é gulosa mesmo
ouvi falar, que pode levantar
mais de dez vezes o próprio peso

Senhora Formiga pára de correr!

-Cala, menina, se não mordo você!

Essa formiga é muito brava
dói bem fininho
a sua picada

Senhora formiga vai embora não!
Se eu te comer
é bom pra visão.

* Fui inspirada por uma lembrança da infância,quando minha mãe ao ver alguma formiga em meu suco dizia que era bom pras vista...(rs)...E eu saia pela casa matando tudo quanto era formiga e comendo uma a uma!(rs)
Vai ver que é por isso que minha visão hoje em dia é supimpa!

sexta-feira, 25 de maio de 2007

Lá em casa tem tu

Lá em casa tem
galinha
conquén
pintinho

Lá em casa tem
siriguela
pitanga
abiu

Tem mico da cerca olhando
o povo chegando em comboio

Tem passarinhos aos bocados
cantando, porque bico tem

Tem as crianças brincando das coisas
que lá na cidade não pode.
treinando carreira,
porque os pés na terra
correm mais ligeiros

Na mesa tem
cuzcuz
manteiga
aimpim
bolo de milho
bolo de ovos

Tudo que puder imaginar
Na mesa tem

Tem os causos de Ronilton
tem os tambores de João na Quaresma
Neguinho no pasto, bonito...
O olhar das meninas querendo ver bem.

Lá em casa tem
boi
cavalo
bezerro

Lá em casa tem
banana
caqui
caju

Lívia
Paula
Flávia

Tem!

Marcelo
Camila

Tem!

E agora tem tu também.

quinta-feira, 24 de maio de 2007

Sobre a morte, sobre meu pai e sobre seu amor em três

Posso ouvir a chave na porta
O tilintar dos talhares no jantar
A língua estalando

A morte tem um brilho próprio
Nela descansa a vida
Um derradeiro suspiro
De um corpo quente.

Ouço roncos nas madrugadas
E sua voz ainda me canta Caymmi

A cozinha com a luz azulada
Dentes mastigando crocancias
A firmeza das suas mãos
Memória de pele

A morte é uma falsa morte
A vida segue por outras vidas
Nas histórias que virão a ser
As memórias dos pequenos
Ao crescerem um tico mais

Meu pai, como parte de mim, permanece
Seus seguimentos de veias são teias em meu corpo

Faço seu nome vivo
No nome do meu filho
É pra ele que vou contar
Sobre nossos amores

Reencontro com teu riso
Em rios de saudade boa...

O grito da perda
Se tornou um silêncio preciso

Na varanda da casa
Adormeceu o homem imenso
De gordo coração
Obesos sonhos

Posso acordá-lo sempre
Quando voltar pra lá
Pro nosso Sítio Três Amores

quarta-feira, 23 de maio de 2007

Filho II



Enquanto ele dorme ao meu lado
Eu escrevo.

A inspiração tem forma plena
Em sua face inocente.

Sobre a dor

Dor
Fita cinza metálica
Amarrada no estômago
Chuvisco constante
Molhando os sapatos
Vagarosamente

Cachoeira escura
Ora visitada
Ora esquecida

Numa gruta acordada
A certeza ensolarada
De um tempo promessa

Palavras

Palavras são comichões
Que inquietam meu corpo
Acordando meus dedos selados

No calar de mim
A palavra fala insistente.

Lembranças Tomates




Depois de ter filho
Passei a cozinhar mais

A arte culinária
Me assalta as mãos

Talvez numa secreta tentativa
De manter vivos
No paladar do meu pequeno
Meus gostos de cozinha

Como estão sempre vivos em mim
O sabor festivo das lasanhas de mamãe
E o gosto bronzeado das tortilhas
De minha avó.

terça-feira, 22 de maio de 2007

Encontro




Esse seu silêncio em meu nariz
Me faz ouvir aviões.


(Para Tiago)


Foto: Tiago Lima (http://www.tiagolima.com)


Cinzas de Maio

Em Maio chove
Nas janelas escorrem lágrimas aos montes
A cidade cinza frio

Contrapesa tantas queimaduras
Com o risco do inverno

Em Maio, me sinto mais Maio
O aconchego dos lençóis
Amornam o esfriar da minha alma
Enquanto sou solidão

Em Maio escrevo mais
Essa distância do sol

Me inspira...

Filho

Ele em sono.
Velo seus olhos,
Em paz

segunda-feira, 21 de maio de 2007

Produto

A alegria da poesia
É a dor do poeta

Materna

De onde mal se sabia
Surge imensa morada
Ternura desperta
Pelo tempo molhado

São feitas de colo
Cor de calor
Trazem no dorso
Punhados de chuvas
Nas mãos
Frutas vermelhas
Nos olhos
A calma maçã

Fadigas contidas
Num sopro verde
Estremecem a cada manhã
Ao ver água macia
Na fonte de pedras
Refletindo luz solar
Em moedas douradas

Contas

Conta pra mim sobre seus mundos
Detalhe sua sorte
Quantas azares te convir

Suas raivas
Seus amores
Seus planos, profanos
Olhares, mundanos
Não minta, se abre
Meu bem é tão tarde...
São meus tantos panos!

Conta devagar
Suas falhas, vitórias
Batalhas, memórias
Caladas, marinhas
Me canta seu mar...

Aprendo contigo
Amante, amigo
Querido,
Querido...
Meu bem, meu amor
Costura o amar

Se parte pra mim
Meu raio, retalho.
Que eu saio
Que eu saio
Contigo no ar.

sábado, 19 de maio de 2007

Soneto guardado

Flor fugida
Em ramalhete de partida
A lágrima quente
Vem temente

Não adianta prometeres
Sei que não voltas
Vai,não entorta
Meu peito com teus dizeres

Guardo tua pele crua
E da negra noite, a lua
Que veio com teus quereres

Guardo o suor salgado
De um pulso frio e sagrado
Do teu corpo morto em prazeres.

Sobremesa

Sobre a mesa um antigo camafeu
Sobre suas brancas terras
Eu

sexta-feira, 18 de maio de 2007

Bisbilhoteira



Da minha janela escuto
O mar e o céu murmurando sobre saudade...


Conselho


Você já foi a Caymmi, nêga?
Não?
Então vá!

Quem se vai com esse nêgo, minha nêga,
Nunca mais quer voltar.

quarta-feira, 16 de maio de 2007

Praça da Espera

Amor, quanto tempo demora?
Aqui, em banco de madeira
Desfolho seu nome na beira
De um chão escuro e sem flora

Amado, será tempo?
Dos beijos que guardo nos lábios
Pra sua salíva em ávidos
Soluços tremidos conter

Enquanto te espero, a saudade
De não te ter chega, arde
Meu colo, meu ventre, meu ser...

Na curva uma turva sombra
Quieta, mansa, assombra
Meus zêlos por ser você.

Segredos


Andei ao vento
Um silêncio ruim
Fora tudo que se faz ouvir
Escutei, ao pé do ouvido,
Meus brincos
Tilin-tilin

Querendo Vinicius...


Meu amor, Vinicius
Por ti tem gosto de uvas
Para se perder em minhas curvas
Queria teu indicio

Meu amor, Vinicius
Por tuas palavras salgadas
Tem saliva grossa, espumada
Do mar com teus malefícios

Foste embora, querido meu
Sem ao menos conhecer-me
Não te toco, embora teime.

Mas me chegas em boa hora
Para um gozo de senhora
Onde te abro e digo: -Queime!

Mudanças num passeio

Arbustos pela cidade
Folhas secas pelo chão
Tantos verdes balançam esperanças
E as flores tão risonhas...
Dançam com o ventinho
Que passa
Mansinho
É como se a menina ainda vivesse
Tudo isso tocando
Como se tocada eu fosse
Pelo amante muito delicado

Vem ventania
Levanta a saia
Vai momento
Num curto espaço de tempo
O mundo pareceu tarado!

Vontades

Sereia
Hei de um dia te prender
Na teia
Da aranha que mora em terra firme
Na ceia
Vou degustar teu sal encruado
Na veia
Teu sangue gelado

Apelos

Meu homem
Tua barba roça minha pele
Que rosada fica
Envergonhada pelos apelos
Que tua boca quase calada
Faz sobre meu pêlos

Pedido de Mar


Ô, jangadeiro, me leva pra longe daqui...
Meu rosário não cabe as rezas que faço toda noite
Me leva pra longe desse cais
Faz trinta dias hoje, que ele foi e num voltou mais

Amor de mar é assim
Leva e traz
E minha rosa voltou...
A sereia achou bobo
O meu pedido de amor...

Naquela noite de lua
Juntou rede, corda,
Um pouco da cachaça
Rumou pro mar
Os cabelos da sereia
Prata serpente refletindo o luar

Meus olhos marearam
Todo tempo que esperei
Eu rezei
Eu rezei

E tu foste apaixonado
Lá pro fundo do azul
De mãos dadas com ela...
Enrolados em pano ventado

Só voltou barco quebrado
E nenhum sinal da vela.

Ô, jangadeiro, me leva pra longe daqui...
Meu rosário não cabe as rezas que faço toda noite
Me leva pra longe desse cais
Faz trinta dias hoje, que ele foi e num voltou mais


Foto: Tiago Lima (http://www.tiagolima.com)

Careceu


Careceu de ser assim
Você e eu

Careceu, moreno
Careceu...

Foi assim, bem ao acaso
Que nosso coração de prendeu.

Foi no mar da Bahia
Meus pés pisaram conchas da beira
E teus olhos, não eram Jabuticabas
Eram a própria Jabuticabeira

Não esperava, que na madrugada
Meus lábios iam juntar mais os seus
Resgatando águas passadas
Que o rio não escorreu.

Careceu de ser assim
Você e eu

Careceu, moreno
Careceu...

Foto: Tiago Lima (http://www.tiagolima.com)